Sobre um vizinho, cujo nome não sei:
“Toc, toc”. Alguém bate na porta. Insiste em bater e ele não vai atender.
“Toc, toc”. “Não vou abrir”, ele pensa, “devem ser as Testemunhas de Jeová”, vou esperar mais um pouco. E eis que novamente a madeira da porta vibra com as batidas fortes que são contra ela lançadas.
“Toc, toc”. “Pela insistência, deve ser minha ex-mulher, querendo pegar um dos meus pertences, que ela acredita ser dela”.
A porta para, e ele olha pelo olho mágico: não vê ninguém. Abre a porta lentamente, com medo de algum golpe supresa de sequestradores experientes. “Se eles quiserem meu dinheiro, terão de primeiro sentir o gostinho de meus golpes de karatê”, ele deve pensar, e abre a porta com uma cautela entediante e, quando não vê ninguém fecha-a depressa, conta de um até dez, em japonês, certamente praticando os golpes que outrora aprendera e imaginando o que faria se o sequestrador não tivesse perdido a paciência e saído de sua porta.
No cinco, ouve a porta bater: “toc”. Agora estava em dúvida se tinha pisado muito forte nos tacos da sala, se voltaram à sua porta, ou se o sequestrador havia entrado em sua casa. Por isso ficava imóvel, em absoluto silêncio, esperando ouvir de novo o barulho alienígena de fontes desconhecidas que tanto transtorno lhe causava.
As janelas estavam fechadas, e a do banheiro era pequena demais para alguém passar. Talvez um rato tivesse entrado em casa, ou algum animal maior. Por isso ia se esgueirando para a cozinha, para garantir que, em silêncio, pegaria a vassoura e aniquilaria o hóspede indesejado.
E então se passavam os dias, confinado em sua casa e mente, por centenas de dias a fio, sem ver a cor do céu. Suprido de alimentos e roupas desnecessárias por familiares que não faziam mais do que cumprir sua função social. Abrindo e fechando a porta várias vezes por semana.
E assim foi durante meses, até que eu e minha família desistimos do inquilino desconhecido. E ele foi consumido por sua compulsão, por sua angústia, transtornado pela porta que insitia em bater. E dessa forma ele definhava.
Sem conseguir solucionar o enigma que o rodeava, o indivíduo perecia, e apenas quando o condomínio decidiu trocar os portões que não se fechavam, é que pudemos ver a face magra e pálida do homem. E tudo porque lhe faltava segurança, algo ou alguém que garantisse que o desconhecido não invadiria seu espaço.
Ele já não ouvia mais o “toc, toc” que lhe incomodara por anos.
E em todo esse tempo, a única pessoa que eu ouvi bater à porta fui eu mesmo, e eu só queria fazer do copo de açúcar um pretexto para dar boas vindas para este novo vizinho. Mas eu batia à sua porta e ele demorava a aparecer. Enquanto que, por outro lado, sua familia abria a porta sem bater, com uma cópia da chave que tinha.
Se alguém batia em alguma coisa, era a sua obsessão que batia em sua cabeça, e “toc, toc” fazia.
E agora que o portão protege sua porta do barulho, ele pode descobrir qual dos tacos de sua casa perturbam seu caminhar, e em qual de seus aposentos aqueles malditos roedores se escondem.